
Essa passagem clássica do evangelho de João constitui-se um dos textos mais belos de toda a Bíblia. Nela, João fala sobre o misterioso acontecimento da encarnação.
Do ponto de vista da apologética, a declaração "e o verbo se fez carne (...)" é um repúdio definido contra todo e qualquer ensinamento gnóstico, tanto no que se refere à natureza do Logos, quanto no que diz respeito à natureza física humana.[2] Uma das crenças básicas do gnosticismo era que a matéria era inerentemente má.[3] Sendo assim, a idéia de que o Cristo pré-encarnado (o Logos) se uniu à matéria (se fez carne) seria uma idéia inconcebível para qualquer gnóstico.
"Assim como o fogo estava na sarça que Moisés viu, igualmente a plenitude da deidade habitava corporalmente em Cristo, que foi feito carne e habitou entre nós. (...) O eterno fogo da natureza divina habitou na sarça da frágil natureza humana, contudo a natureza humana não foi consumida".[5]
Outro aspecto que deve ser salientado é o verbo morou: "o verbo se fez carne e morou (...)". Aqui, o verbo usado para "morou" é o verbo grego eskenosen, derivado de eskenoo, "viver numa tenda, estabelecer-se". Tal vocábulo dá a entender que "a carne de Jesus Cristo é a nova localização da presença de Deus na terra; Jesus substitui o antigo tabernáculo".[6] Em outras palavras, poderíamos traduzir o início de Jo 1.14 assim: "E o verbo se fez carne e tabernaculou (montou tabernáculo) entre nós (...)". Javé, que havia dito a Davi nas páginas do Antigo Testamento: "andei em tenda e em tabernáculo" (2 Sm 7.6), acaba encontrando o fim de sua peregrinação terrena no último de seus tabernáculos: a carne humana.
Finalmente, assim como depois da construção do tabernáculo, a glória de Deus o encheu (Ex 40.34), da mesma forma, após o Logos "ter montado a Sua tenda entre os humanos" (através da encarnação de Cristo), nós "vimos a sua glória"!
Àquele que quis se parecer conosco para que nós pudéssemos nos parecer com Ele, glória e louvor para todo o sempre!!
Carlos Augusto Vailatti
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[1] Minha tradução do texto.
[2] CHAMPLIN, Russell Norman. O Novo Testamento Interpretado: versículo por versículo. Vol.2. São Paulo, Candeia, 1995, p.272.
[3] ERICKSON, Millard J. Conciso Dicionário de Teologia Cristã. Rio de Janeiro, Juerp, 1995, p.74.
[4] CHAMPLIN, Russell Norman. Op.Cit., p.273.[5] OWEN, John. A Glória de Cristo. São Paulo, Pes, 1989, p.24.
[6] RIENECKER, Fritz & ROGERS, Cleon. Chave Lingüística do Novo Testamento Grego. São Paulo, Vida Nova, 1995, p.162.
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