A Religião do “Vale Tudo”
O “vale tudo” é aquela modalidade de luta que permite aos lutadores praticarem numa única competição golpes que são característicos de vários tipos de artes marciais. No Brasil, por exemplo, misturam-se golpes de jiu-jitsu, boxe e muay thai. De forma geral, podemos definir o “vale tudo” como aquele tipo de luta onde praticamente não há regras e nem restrições com relação aos golpes desferidos e também onde há o contato pleno entre os lutadores.
Bem, transferindo este conceito de “vale tudo” dos ringues para o campo da fenomenologia da religião, atrevo-me a dizer que estamos vivendo dias nos quais a religião tem se valido de tal modalidade de luta a fim de poder conquistar os seus fiéis. Como diziam os antigos: “Estamos vivendo nos fins dos tempos!”.
Ora, para exemplificar o que digo, cito aqui a reportagem da revista Veja Rio (edição de 07/10/2009 - Ano 42 - Nº 40) que li dias atrás. O título da capa deste prestigiado meio de comunicação trazia o seguinte enunciado sobre as práticas de algumas igrejas católicas do Rio de Janeiro: “GUERRA SANTA - Na luta por fiéis, igrejas católicas da cidade promovem festas, sessões de exorcismo e até bênção de animais”. Ao ler esta revista de forma mais detida, me deparei com alguns fatos bastante intrigantes. Segundo a reportagem, “o leque de atrações [na Igreja Católica] se abriu: há (...) sessões de exorcismo, bênçãos de animais e festas rave embaladas por trilha sonora eclesiástica” (pp.19,20). Além disso, a reportagem ainda diz que "cachorros, gatos, papagaios e passarinhos são bem-vindos o ano inteiro [para serem benzidos pelo padre dentro da igreja!]. Tem até gente que vai à missa acompanhada do bichinho de estimação”(p.22). Porém, antes de reparar no “cisco” que está no olho do catolicismo, temos que enxergar primeiro a “trave” que está no olho do nosso evangelicalismo atual.
De uns tempos pra cá, vários segmentos da igreja evangélica brasileira têm lutado insistentemente o “vale tudo” em cima dos púlpitos, nos programas televisivos, nas rádios e também através das propagandas distribuídas em panfletos. Tudo isso tem sido feito no afã de trazer novos fiéis para dentro do aprisco do Senhor. No tatame, são dados golpes com os pés, com os joelhos, com os punhos etc. Já na esfera do sagrado, os golpes também são bem diversificados. Eis alguns deles: distribuição de rosas ungidas, sabonetes ungidos, fitas e pulseiras ungidas, sal grosso, pedra ungida e vassoura consagrada, para citar apenas alguns. Além disso, há também a reunião da troca do anjo (onde o seu anjo “fraco” pode ser substituído por outro mais forte), o tal do toque profético do shofar, a corrente das sete semanas, o tradicional copo com água abençoado (a versão “evangélica” da água benta) e tantos outros “golpes” de “vale tudo” que são praticados com o intuito de “nocautear” os novos fiéis.
É curioso observar que as regiões do corpo que são afetadas no “vale tudo” são praticamente as mesmas tanto nos ringues quanto nos púlpitos. Aliás, destes últimos são desferidos golpes principalmente:
1) contra a “cabeça” dos fiéis (por meio de uma pregação muitas vezes saturada de elementos extraídos da programação neurolinguística [PNL], que segue técnicas “Lair Ribeirianas”, técnicas de sugestionamento, verborragia positivista e outras que seguem o modelo: “suas palavras têm poder”);
2) contra o “coração” dos fiéis (através de apelos motivacionais, chantagens psicológicas, modismos etc);
3) contra o “bolso” dos fiéis (por intermédio de um culto que gira em torno de apelos financeiros, teologia da prosperidade e situações afins, nas quais é dito, por exemplo: “Deus só irá te abençoar se você der uma boa quantia de oferta”. Parafraseando aquele conhecido ditado: “templo é dinheiro!”).
Sei que devemos nos adaptar aos novos tempos em que vivemos. Todavia, esta “adaptação” jamais poderá ser confundida com o ato de fazer certas concessões com relação às verdades absolutas contidas no Evangelho de Cristo. Hoje, muitas igrejas, ao correrem atrás de suas “clientelas” e de seus “fregueses”, estão usando todos os tipos de artifícios com o objetivo de poder “fisgar” seus novos adeptos. Porém, creio que devemos ser bastante cautelosos em nossas “técnicas de conversão”, pois há uma linha muito tênue entre a “criatividade sadia” que Deus nos dá para que ganhemos almas (Pv 11.30b) e a “manipulação carnal” que é empregada por muitos “espertos” com o propósito de iludir e enganar os incautos (Mt 7.15).
Tomemos bastante cuidado, pois nessa luta de “vale tudo”, nós mesmos estamos correndo o sério risco de sermos “nocauteados” a qualquer momento.
Em Cristo,
Carlos Augusto Vailatti
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